PAISAGENS SONORAS E MEMORIAS INSERIDAS NA ARQUITETURA

Os sons presentes nas paisagens sonoras podem ser agradáveis e gerarem emoções boas, mas também podem ser sem harmonia (ruídos) e gerarem emoções um tanto incômodas. No entanto, todos os sons criam lembranças, essas lembranças então podem ser reativadas em nossa memória assim que escutamos tais sons novamente, ou mesmo sons similares aos de experiências passadas, sendo junto ao olfato o principal criador da sensação de nostalgia. Você mesmo deve ter uma música específica talvez, que era escutada no carro dos pais em uma viagem a um lugar específico, que ocorria com certa frequência, e hoje em dia ouvir essa música te traz lembranças desses momentos e lugares. Mas infelizmente o uso desse meio sonoro na arquitetura ainda é raro e muito novo, isso de maneira interativa para gerar emoções distintas, tendo poucos exemplos vindos de alguns arquitetos, como Tadao Ando. É muito mais comum a utilização de estratégias para controle acústico apenas.

A Paisagem Sonora (Soundscape) compreende na construção perceptiva do som no espaço físico, mas de uma forma que excede apenas a recepção física sonora, abrangendo também uma percepção psicológica dentro o ambiente acústico. Murray R. Schafer introduz o conceito de Sounscapes como “qualquer campo de estudo acústico”, a “ISO 12913: Acoustics – Soundscape” define soundscape como o ambiente acústico percebido ou experiência do e/ou entendido por uma pessoa ou pessoas, em contexto. (o contexto é tido como o lugar físico onde o ambiente acústico existe, que inclui as inter-relações entre a pessoa, a atividade e o lugar, no espaço e no tempo […] e pode influenciar a paisagem sonora através da sensação auditiva, da interpretação da sensação auditiva, e das respostas ao ambiente acústico
ambiente acústico e paisagem sonora não são a mesma coisa, um é apenas espaço físico e o outro uma construção perceptiva que se encontra no espaço físico).

Dentro da arquitetura então, podemos utilizar estratégias novas que acrescentem esse fator dentro do ambiente construído, criando novas sensações a partir do que se escuta, ou também misturando outros sentidos, que unidos a audição, causem emoções diferentes em quem experiência o espaço. No desenvolvimento do meu trabalho final de graduação eu realizei um estudo sobre como as paisagens sonoras influenciariam na vivência das pessoas com o espaço e suas memórias, chegando até a analisar a sinestesia como um fator chave para essa experiência.

Com isso vi que alinhando os elementos visuais do espaço com o som que todos percebem ali poderia evidenciar ainda mais a paisagem sonora, e levar a atenção de quem passa, diretamente à percepção sonora e as relações que poderiam ocorrer com lembranças – essas lembranças são específicas de cada um, mas geralmente a percepção visual tende a ser mais generalizada. E num método que chamei de Harmonia da Lembrança, mostrei que a partir dessa ligação entre as diversas percepções, seria possível realmente destacar memórias pessoais em um espaço construído.

Uma maneira interessante, e simples, de experiência a paisagem sonora é por meio de um soundwalk. Mas o que seria isso afinal? Soundwalk é um método de analisar mais a fundo a experiência com a paisagem sonora, em que você pode simplesmente ao caminhar por um lugar qualquer, prestar maior atenção nos sons do ambiente e pensar a fundo como eles te influenciam. Um soundwalk pode também ser algo mais técnico, onde alguém grava tal caminhada pra ser analisada depois e também escutada por outros, isolada de influência visual. O que posso dizer e recomendar é que você preste mais atenção no que está a sua volta, mas quem sabe de olhos fechados, ouvindo tudo que se passa na paisagem sonora e pensando em como aquilo te afeta.

O som se tornou cada vez mais um plano de fundo, muito por conta de uma cultura extremamente visual que foi construída nos últimos tempos, mas é crucial ressaltarmos a importância dos sons no espaço, e não apenas como consequência gerada, mas como parte construída do espaço. Sem os sons o ambiente nada seria, e se tornaria monótono e estático, o tempo em si pareceria não passar. Perder a capacidade de audição é o mesmo que se perder no tempo, se desencontrar. E como arquiteto é importante tentar imaginar como a paisagem sonora poderia ser usada dentro de um projeto, deixando o som fazer parte da experiência sensorial na arquitetura.

Seja o som já presente no lugar, ou talvez seja incorporado de alguma forma na construção ou por meio de tecnologias – o som de pássaros que já são da região, a água sendo usada como elemento dinâmico que cria seu próprio som, ou até mesmo a automação residencial nos deixando brincar e criar com o som do espaço unido aos elementos visuais já comuns na arquitetura.

Iago Alvarez Silva. Arquiteto da Modelo A (https://modeloa.com.br) em Cotia, formado em Arquitetura e Urbanismo pela UNESP de Bauru/SP.

Fonte: Paisagens Sonoras da Memória, Iago Alvarez (2019).
Para saber mais sobre o estudo Paisagens Sonoras da Memória:
https://issuu.com/iagoalvarez/docs/paisagens_sonoras_da_mem_ria_livro_com_capa

Matéria da revista AETEC 35º edição.

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