SUSTENTABILIDADE: AINDA E SEMPRE

Analisando a história da civilização, sem precisar de uma profunda observação, percebe-se que a produção de bens e serviços mudou muito ao longo dos anos. Até meados de 1780, existia uma sociedade agrícola e artesanal com baixo volume de produção e, praticamente, sem tecnologia (com base nos conceitos atuais). Com a Primeira Revolução Industrial, a produção mudou com o uso intenso de máquinas, aumento do volume produzido e do consumo, maior capacidade de transporte em relação ao volume e distâncias.
Em meados dos anos 1980 até hoje, vivemos uma sociedade e um processo produtivo digital e altamente tecnológico.
Assim, tem-se uma diversidade de produtos, uma distribuição mundial dos mesmos e uma exploração maior ainda dos recursos naturais.

Atualmente, tudo ocorre de forma muito mais rápida: evolução dos processos produtivos, necessidades de novas habilidades nas pessoas nesse mundo altamente tecnológico, novos modelos de negócios envolvendo produção e logística.
Um dia desses depositei um cheque pelo aplicativo da cooperativa de crédito: achei o máximo! Toda essa tecnologia traz muitos benefícios para os usuários (lembra do depósito do cheque sem sair de casa?), mas o crescimento da população acarreta um maior consumo de bens para atender às necessidades dessa mesma população, gerando maior produção de diversos itens para lazer, alimentação, transporte, estudo, trabalho, etc…

Então ocorre um sério problema: a exploração intensa de recursos naturais de forma tal que a Terra não tenha condição de se recuperar dessa exploração, causando um desequilíbrio no ecossistema, bem como impactos pelo descarte de resíduos da produção e do consumo. Diversos autores e pesquisadores consideram que o ecossistema terrestre é incapaz de sustentar o nível de atividade econômica atual.
Assim, a poluição ambiental produz impactos na saúde da população, alto nível de emissão de gases do efeito estufa (GEE) e muitos outros. Tais impactos causados pelo homem ao meio ambiente fez com que surgissem diversos movimentos e conceitos relativos à preservação do planeta, entre eles, a sustentabilidade, uma forma de buscar um equilíbrio dessa situação preocupante vivida em várias partes do mundo. Porém a sustentabilidade ainda é compreendida e interpretada de formas diferentes por diversos países, comprometendo o significado e os resultados desejados.

O termo sustentabilidade teve maior relevância a partir da década de 1970 com a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente Humano (Estocolmo, 1972), uma manifestação de forma clara e a nível mundial da preocupação com as questões ambientais globais. O Relatório Brundtland – Our Common Future (Nosso Futuro Comum), da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1987), formaliza pela primeira vez o conceito de desenvolvimento sustentável: “é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades e aspirações”.

Com o avanço dos estudos sobre sustentabilidade, surge o conceito The Triple Botton Line – tripé da sustentabilidade ou 3 P´s: people, profit and planet ou pessoas, lucro e planeta. Ou seja, uma forma conciliatória que trate os aspectos sociais, econômicos e ambientais nas atividades em geral, incluindo a produtiva. Pessoas envolvem variáveis sociais que lidam com comunidades, educação, equidade de recursos, saúde, bem-estar, além de qualidade de vida. Lucro considera variáveis econômicas de forma geral, fluxo e geração de caixa. Planeta refere-se aos aspectos relacionados
aos recursos naturais, qualidade da água e do ar, conservação de energia e uso do solo. É uma equação complexa, mas que tem que ser resolvida.

A Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu, em 2015, os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), dentro da Agenda 2030, com a meta de criar um conjunto de objetivos que suprissem os desafios ambientais, políticos e econômicos mais urgentes que o mundo enfrentava, e ainda enfrenta, com foco nas pessoas, planeta, prosperidade, paz e parcerias. Nos países em desenvolvimento com grandes diferenças econômicas, sociais e ambientais, como o
Brasil, há a necessidade de atuação em todos os 17 objetivos definidos pela ONU.

Pode-se observar alguns dados importantes ou alarmantes em relação à produção e seus efeitos: a produção de bens/serviços gera uma quantidade significativa de resíduos; a gestão de resíduos sólidos (GRS), seja da produção ou do consumo, é um grande desafio para os governos, principalmente nos centros urbanos; em 2013, as cidades em todo o mundo geravam em torno de 1,3 bilhão de toneladas de resíduos sólidos/ano, quantidade que duplicará nos próximos 20 anos em países de baixa renda; em termos globais, o custo anual da GRS supera US$ 200 bilhões. Outro impacto da não reciclagem se refere às emissões significativas e desnecessárias de GEE. Apenas 9% do material utilizado na produção industrial retorna ao processo produtivo ou ao meio ambiente de forma devida.

A coleta seletiva de resíduos só está disponível em 17% dos municípios (dados de 2015), muitos dos quais sem condições de tratamento. Diante desse cenário nada positivo, é necessário desenvolver modelos que possibilitem dar escala para as atividades de reciclagem e reutilização de resíduos dos processos produtivos.

Outro impacto significativo vem da produção de equipamentos eletroeletrônicos (EEE): na produção de smartphones são utilizados elementos raros, como neodímio, tântalo, além de ouro e prata; só os smartphones usaram, em 2010, 42% da produção global de tântalo; a Ellen MacArthur Foundation estima que, em 2012, 160 milhões de celulares foram descartados com perdas de US$ 500 milhões. Um estudo mostrou que uma tonelada de celulares descartados tem 150 g de ouro, porém, uma tonelada de minério na mina tem pouco mais que 5 g, além de outros materiais na mesma tonelada de celulares: 100 kg de cobre e 3 kg de prata.

Vários países desenvolveram políticas para tratamento de resíduos. No Brasil, temos a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), lei n° 13205/2010), com aspectos sobre coleta e direcionamento adequado de resíduos sólidos das empresas para reaproveitamento no ciclo produtivo das mesmas, ou, em caso de não ser material reaproveitável, a correta destinação ambiental. Isso fez com que empresas buscassem alternativas para tornarem o processo de produção sustentável, envolvendo não só a produção, mas toda a sua cadeia de stakeholders, ou seja, uma política que interfere no modusoperandi das empresas para menor geração de resíduos dos processos produtivos e devida destinação e tratamento dos mesmos. Uma política bem definida, mas que levou cerca de 12 anos para ser regulamentada (decreto n° 10935, de 12.01.2022). Aí surge a pergunta que não quer calar: foi falta de foco e interesse de governos anteriores ou uma forte pressão de lobbies das indústrias impactadas pela PNRS junto
ao Congresso?

A sustentabilidade é uma necessidade premente: os 3 P´s são importantes e devem ter toda a atenção possível. Uma forma de buscar a sustentabilidade tanto desejada está na economia circular, aspecto que considera os 3 P´s, bem como ações que contribuem para os 17 ODS (veja artigo publicado na revista AETEC n° 35). Vale a pena a leitura.

Mauro Campello. Mestre e engenheiro de produção. Palestrante, professor, consultor e estudioso em temas variados. Experiência em diversas áreas de negócios. Sócio da MC Treinamentos.

Matéria da revista AETEC nº 40 edição.

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